O direito ao esquecimento – como e quando é possível ter registros pessoais apagados do Google?
Imagine-se em um mundo onde qualquer fato de sua vida possa se tornar público, com as informações sobre você – verídicas ou não – eternizadas e acessíveis a qualquer pessoa que se disponha a pesquisar seu nome na internet. Pois é, nós vivemos neste mundo. Entretanto, esta situação que parece ser absurda configura-se, em alguns casos, em nítida violação a preceitos previstos na Constituição Federal, como a dignidade da pessoa e o direito à intimidade, sendo equivalente a uma penalização perpétua.
Prevendo casos semelhantes, há uma tendência mundial em se proteger o chamado “direito ao esquecimento” (expressão que vem da doutrina estrangeira: “right to be forgotten”), já que pessoa alguma seria obrigada a confrontar para sempre os erros de seu passado. Recentemente, o Tribunal de Justiça da União Europeia (leia mais sobre o assunto neste link - em inglês) decidiu que havia a obrigatoriedade de que o Google eliminasse os links que mencionassem o leilão do imóvel de um espanhol, isso porque o cidadão em questão havia cumprido com suas obrigações e levantado a penhora que recaía sobre o bem. A subsistência da informação mostrava-se, pois, completamente desatualizada e desnecessária. Seguindo esta linha de raciocínio, há um formulário disponível para preenchimento nas páginas do Google sediadas na União Europeia, em que os cidadãos europeus podem requerer à empresa que suprima links para páginas com informações pessoais desatualizadas, antigas ou inexatas.
Por ora, no Brasil, o Google disponibiliza uma página para pedidos de remoção de conteúdo, recomendando que o indivíduo entre em contato primeiramente com o webmaster do site onde seu nome é mencionado. Em sua “política de remoção”, a empresa destaca que apenas remove conteúdo quando se tratar de informações pessoais, como o número do CPF, imagem de assinatura, números de contas bancárias ou imagens de nudez compartilhadas sem consentimento.
Em âmbito judicial, o Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Especial relatado pelo Ministro Luis Felipe Salomão, decidiu pelo “direito ao esquecimento” em caso no qual o nome de uma pessoa acusada à época da Chacina da Candelária e, posteriormente inocentada, foi mencionada pela Rede Globo (REsp 1334097/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 10/09/2013). Pois bem, muito embora o fato tenha sido público e notório, à época, é evidente que o indivíduo em questão, inocentado em processo judicial, não raro voltava a enfrentar novamente as acusações, sempre que seu nome era mencionado.
Na esfera legislativa, por sua vez, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2.712/2015, que modifica o Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014) para obrigar os provedores “de internet a remover, por solicitação do interessado, referências a registros sobre sua pessoa na internet, nas condições que especifica”. Segundo a exposição de motivos da referida peça legislativa, os condicionantes para remoção do conteúdo seriam os seguintes: “só se aplica a fatos que não tenham relevância social para a coletividade” e “a informação a ser removida não se refira a fatos genuinamente históricos”.
Apesar de toda a discussão, o “direito ao esquecimento” não é absoluto. Na decisão do caso C-131/12, do Tribunal de Justiça da União Europeia, são mencionadas as condições para remoção de conteúdo, com as quais concordamos e cuja aplicação deverá reverberar também no Brasil: a informação sobre o indivíduo deve ser “imprecisa, inadequada, irrelevante ou excessiva”, havendo, ademais, que se fazer “um balanceamento com outros direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa”. A análise, portanto, sobre o que deve e o que não deve ser excluído, deve ser feita discricionariamente, caso a caso e não implicará em eliminação do conteúdo apenas por vontade unilateral de quem for mencionado.